Etiqueta Vaishnava

por Giridhari Das

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O que é Etiqueta Vaishnava?

Etiqueta Vaishnava é um conjunto de comportamentos que facilita a consciência de Krishna, atrai as bençãos dos devotos e torna sublime a associação com devotos.

O Senhor Chaitanya Mahaprabhu, ao instruir Sanatana Goswami, disse que “…caracteristicamente um devoto observa e protege a etiqueta Vaishnava. Manter a etiqueta Vaishnava é o ornamento do devoto”. (CC Antya 4.129-30)

Quando perguntado como se identificava um Vaishnava, Srila Prabhupada, o fundador-acharya da ISKCON, respondeu: “Ele é um cavalheiro perfeito”.

Etiqueta com Pessoas
1. Lidando com pessoas em geral

Não há sentido em se proclamar devoto amoroso de Deus e tratar mal desnecessariamente qualquer ser vivo. É prática intrínseca de bhakti-yoga ser gentil e bondoso com todos os que são inocentes e não-violentos.

“Toda pessoa deve agir assim: ao encontrar uma pessoa mais qualificada do que ele, deve ficar muito satisfeito; ao encontrar uma pessoa menos qualificada, deve ter compaixão; e ao encontrar alguém igualmente qualificado, deve estabelecer um vínculo amistoso. Dessa maneira, a pessoa nunca é afetada pelas três misérias do mundo material.” (SB 4.8.34 – Narada Muni instrui Dhruva Maharaja)

“Um devoto intermediário ou de segunda classe, chamado de madyama-adhikari, oferece seu amor a Suprema Personalidade de Deus, é um amigo sincero a todos os devotos do Senhor, mostra misericórdia às pessoas ignorantes que são inocentes e ignora aqueles que são invejosos da Suprema Personalidade de Deus.” (SB 11.2.46)

É também um princípio básico de toda boa civilização demonstrar muito respeito para com nossos pais, tios e qualquer pessoa idosa.

2. Lidando com devotos

“Devotos” são aqui definidos como todos aqueles que desejam sinceramente avançar em consciência de Deus, seja dentro do Movimento Hare Krishna (ISKCON), seja em outras religiões. Nesse sentido, é importante lembrar a afirmação de Prabhupada:

“Querer ser consciente de Krishna é tão bom quanto estar num estado de consciência de Krishna. Não há verdadeira diferença; é como a diferença entre mangas verdes e mangas maduras. A manga madura não é uma manga diferente, mas é somente uma condição da manga verde” (Carta a Robert Hendry  –  Los Angeles 3 de agosto, 1969)

Existe uma hierarquia natural na consciência de Krishna, onde devemos ter um cuidado especial ao lidar com devotos mais avançados:

“Deve-se honrar mentalmente o devoto que canta o santo nome do Senhor Krishna, deve-se oferecer humildes reverências ao devoto que já foi iniciado e está ocupado em adorar a Deidade e deve-se buscar a associação e fielmente servir o devoto puro que está avançado em puro serviço devocional, e cujo coração está livre da propensão a criticar outros”. (Néctar da Instrução, verso 5)

Alguns parâmetros básicos para reconhecer um devoto mais avançado são:

1)      Aquele que é um devoto há mais tempo que nós;

2)      Aquele mais engajado em serviço devocional que nós;

3)      Aquele que está ocupado em trabalhos missionários;

4)      Aquele que é o líder ou está numa posição administrativa em um templo ou projeto missionário;

Devemos respeitar os devotos mais avançados e servi-los sempre que possível. Algumas instruções práticas incluem:

1)      não tente ocupá-los em algum serviço, a não ser que você esteja numa posição administrativa e eles tenham se oferecido para seguir suas ordens ou lhe solicitado algum serviço;

2)      não os instrua, a não ser que tenham solicitado sua instrução ou estejam sentados para ouvir sua aula;

3)      não os corrija ou fale de forma desagradável com eles;

4)      não os ofereça prasadam de seu prato;

5)      não os interrompa quando estão falando;

6)      sirva prasadam a eles primeiro;

7)      quando chegam num programa (aula, festival, etc.) ofereça um assento ou almofada;

8)      peça a instrução deles;

Esse comportamento torna o ambiente doce e favorece o avanço espiritual, invocando a tão importante benção e ajuda dos devotos mais experientes.

Mais avançado ou não, devemos sempre ter um cuidado especial com os devotos:

“Na verdade, é dever do devoto fazer que todos apreciem o valor dos devotos. Ninguém deve criticar ninguém.” (Carta de Srila Prabhupada a Tamal Krishna, 19 de agosto de 1968)

“Devoto significa [ser] muito generoso e gentil com todos, sempre um cavalheiro sob todas as condições da vida.” (Carta de Srila Prabhupada a Hamsaduta, 10 de dezembro de 1972)

Com o objetivo de que desenvolvêssemos uma atitude de respeito e nos enquadrássemos na mentalidade correta, Srila Prabhupada pediu-nos para utilizar títulos respeitosos ao nos dirigir a outros devotos.

“Eu pedi a todos vocês que se dirijam aos seus irmãos espirituais como prabhu. Esse termo, prabhu, significa chefe. Se todos acharmos que nossos colegas de trabalho [missionário] são chefes, não haverá possibilidade de desentendimentos. O erro está em ser chamado de chefe ou prabhu e se achar exatamente um prabhu ou chefe. A pessoa não deve esquecer que é um servo humilde, mesmo sendo chamado de prabhu.” (Carta de Srila Prabhupada a Nandarani, 28 de novembro de 1967)

Assim, os devotos se dirigem aos outros com o termo “prabhu“, que era usado por Prabhupada tanto para homens como mulheres. Em países latino-americanos pouco se usa o “prabhu” para mulheres, mas nos EUA e Europa as devotas costumam não gostar de serem chamadas de “mataji“, o que significa “mãezinha” em bengali.

Em todo o caso, o devoto sempre sabe que a posição que ele almeja é de ser servo do servo do servo de Krishna… mil vezes distante! Nunca o mestre ouprabhu.

“Um Vaishnava é sempre humilde e meigo, e nunca cheio de si mesmo, mesmo que ele tenha as mais elevadas qualidades dos semideuses.” (Carta de Srila Prabhupada a Upendra, 18 de agosto de 1970)

Em nossa sociedade de devotos, há uma categoria que merece cuidado especial, que são os sannyasis. Os sannyasis são aqueles que receberam a 3ª iniciação, fazendo votos de renúncia e celibato vitalícios, tendo em seus nomes o título “Swami” ou “Goswami“. É dito que se deve prestar reverências tocando a cabeça ao chão, sempre que se vê um sannyasi. A nos referirmos a eles para terceiros, devemos usar o título “Sua Santidade” ou “Srila” e quando nos dirigirmos a eles diretamente, “Maharaja“. Não se usa o termo “prabhu” ao se dirigir a um sannyasi.

O mestre espiritual merece um cuidado ainda maior, pois o mestre espiritual é o representante de Deus. Existe o mestre espiritual que nos dá iniciação (diksa-guru) e o mestre espiritual que nos ensina ou que nos guia na vida espiritual (siksha-guru). Às vezes é a mesma pessoa, mas, na ISKCON, quase sempre não é. Muitas vezes temos em nossa vida um devoto que aceitamos como sendo sério e avançado, que nos guia e nutre nossa consciência de Krishna, mas que não é a mesma pessoa que nos deu ou dará iniciação formal. A regra de etiqueta Vaishnava é que não devemos dar um tratamento diferenciado entre os dois. Os dois merecem o mesmo grau de respeito e serviço. Algumas instruções básicas em lidar com o guru são:

1)      Deve-se sempre oferecer reverências tocando a cabeça ao chão ao vê-lo e ao pedir licença para se retirar;

2)      Não se deve sentar no mesmo nível ou mais alto que o guru;

3)      Deve-se prestar todo tipo de serviço possível ao guru;

4)      Deve-se compreender que a ordem do guru é meta suprema na vida;

5)      Deve-se anualmente presentear o guru, em seu dia de aparecimento, com palavras de respeito e uma doação (dakshin).

3. Ao ouvir uma palestra

Algumas regras básicas ao comparecer a uma palestra ou aula dos devotos são:

1)      certifique-se que o palestrante está com um copo d´água cheio;

2)      mantenha-se em total silêncio, exceto para fazer uma pergunta ao palestrante;

3)      desligue o celular;

4)      evite retirar-se antes do final da aula, mas se tiver que fazê-lo, preste primeiro reverências ao palestrante, tocando a cabeça ao chão;

5)      não deixe sua criança correr pela sala ou fazer barulho – leve-a para fora. É uma tortura para uma criança comum ter que ficar sentada quieta durante uma aula e é um incômodo para os demais ter uma criança fazendo barulho durante a aula;

6)      não aponte seus pés para palestrante;

7)      não se deite.

4. Evitando ofensas

De acordo com as escrituras, cometer uma ofensa a um servo de Deus (Vaishnava aparadha) acarreta grande dificuldade em nossa vida espiritual. Seguindo as recomendações acima descritas, evitamos cometer uma ofensa a um devoto. Porém, se porventura cometermos uma ofensa, a única maneira de retratar o erro é pedir humildemente desculpas ao devoto em questão.

5. Corrigindo devotos

Deve-se ter muito cuidado ao corrigir um devoto. A pessoa que corrige deve ter as seguintes qualificações:

1)      ser livre de inveja;

2)      ser sinceramente desejosa de ajudar o outro devoto a avançar em consciência de Krishna;

3)      estar em uma posição espiritual ou administrativa que justifica e/ou necessita que faça tal correção;

4)      ou estar respondendo a um pedido pessoal do devoto em questão para ser corrigido.

O devoto deve ainda estar praticando o que ensina ao devoto que está corrigindo.

Um devoto nunca deve corrigir alguém mais experiente ou avançado que ele. Se ele achar que um devoto numa posição mais avançada que ele está cometendo um erro, ele deve se aproximar de outro devoto igualmente mais avançado com quem tem mais intimidade e pedir sua ajuda ou conselhos sobre como ajustar a situação.

6. Considerações gerais

1)      Não aponte seus pés a qualquer devoto;

2)      Não toque qualquer devoto com seu pé;

3)      Não caminhe por cima de qualquer devoto;

4)      O corpo do devoto é considerado sagrado;

5)      Comporte-se gentilmente, vendo todos os devotos no Movimento como representantes de Srila Prabhupada;

6)      Tenha muito cuidado para não ofender um devoto.

Etiqueta com Deidades e Objetos Sagrados
1. Deidades

A Deidade é Deus aparecendo em objetos aparentemente materiais. Portanto, todo cuidado e respeito é pouco quando diante da Deidade, de Deus. Algumas instruções básicas:

1)      ofereça sempre suas reverências ao ver a Deidade;

2)      não toque a Deidade a não ser que seja a serviço;

3)      não fale de assuntos mundanos diante da Deidade;

4)      não se deite diante da Deidade;

5)      não aponte seus pés para a Deidade;

6)      sempre que possível, não sente de costas para a Deidade;

7)      não corrija ninguém em frente a Deidade.

2. Quadros, livros, japa-mala e outros objetos

Quadros de imagens espirituais, formas de Deus ou fotos do mestre espiritual são sagrados. Os livros sagrados são as instruções de Deus, portanto não diferentes dEle. Japa-mala, parafernália do altar, tulasi, tilak, etc. são também todos itens sagrados.

Tais itens devem ser tocados apenas com as mãos limpas, devem mantidos limpos e nunca colocados no chão, cama e outros lugares não limpos. Nunca devem ser levados para dentro de um banheiro (com exceção da tilak que alguns devotos aplicam no banheiro). Nunca devem ser arremessados, senão que sempre transportados com reverência e atenção.

Considera-se que as mãos não estão limpas (e portanto não devem tocar em nada limpo antes de serem lavadas, especialmente os devotos e objetos sagrados) nas seguintes situações:

1)      depois de comer;

2)      depois de ir ao banheiro;

3)      depois de tocar a boca, olhos, ouvido, interior do nariz ou outras partes não limpas do corpo;

4)      depois de tocar um animal;

5)      depois de beber qualquer líquido;

6)      depois de tocar qualquer coisa suja.

Na cultura védica (e em muitas outras culturas asiáticas), a mão direita é reservada para coisas limpas, como comer, e a esquerda para as sujas, como o ato de se limpar no banheiro.

3. Como se comportar no Templo

O templo é a casa de Deus. Algumas regras básicas devem ser seguidas ao visitar um templo:

1)      sempre que possível, visite o templo de banho tomado;

2)      use roupas apropriadas para um local sagrado: roupas que são castas, limpas e dignas ou, em outras palavras, roupas que não trazem atenção ao seu corpo ou são demasiadamente opulentas;

3)      retire seus sapatos e deixe-os no local indicado, deixando sempre a passagem livre;

4)      se houver um sino na porta, soe-o levemente ou bata na porta três vezes antes de entrar, se possível saudando suavemente o nome das Deidades, como “Jaya Goura-Nitai! Jaya Jagannatha, Balarama, Subhadra!“  – isso é como tocar a campainha ou bater palmas e chamar o nome do proprietário antes de entrar na casa de alguém;

5)      ao entrar, preste reverências a Srila Prabhupada e as Deidades, pronunciando o guru pranam;

a.      O guru pranam é o mantra em reverência ao guru. Quem não for iniciado canta apenas as duas linhas do mantra de Srila Prabhupada:

nama om visnu-padaya krsna-presthaya bhu-tale

srimate bhaktivedanta-svamin iti namine

namas te sarasvate deve gaura-vani-pracarine

nirvisesa-sunyavadi-pascatya-desa-tarine

b.      Quem for iniciado, deve entoar o mantra de seu guru e depois o de Srila Prabhupada.

c.      Mulheres prestam reverências tocando os pés, mãos e cabeça ao chão, mas homens devem prestar dandavats, que significa “como uma vara”, estendendo-se por completo no chão. Mulheres não prestam dandavats, porque seus seios e ventre são considerados sagrados e não devem tocar no chão.

6)      nos templos é costume homens e mulheres ficarem em lados separados, para facilitar maior concentração na aula ou na Deidade –  observe em que lado estão os homens e mulheres e dirija-se ao lado correto;

7)      ao receber ou compartilhar artigos que foram oferecidos para a Deidade, como flores, água e a lamparina, use sempre a mão direita;

8)      durante os kirtans e bhajans, esforce-se para acompanhar as letras e mantras – todas as canções podem ser aprendidas adquirindo-se livros como “Manual Vaishnava” ou “Canções Vaisanavas”;

9)      ao final do kirtan, um líder do grupo vai entoar as orações “prema dhvani” (aquelas que terminam com “ki jay“); ao final delas, cada um entoa as orações ao guru como acima descrito;

10)  ao receber prasadam, honre-a com uma atitude devocional e coma com sua mão direita, nunca a esquerda, tentando não deixar restos no prato;

a.      após comer, suas mãos estarão sujas, portanto não se sirva mais, nem sirva aos outros antes de lavar as mãos;

b.      ao servir prasadam, não deixe a colher de servir tocar no prato, especialmente um já utilizado.

11)  não se aproxime de pessoas do sexo oposto sem uma boa razão devocional;

12)  evite toda discussão mundana dentro do templo, entoe apenas vibrações transcendentais dos ensinamentos e mantras.

Conclusão

Foram apresentadas acima algumas regras básicas da etiqueta Vaishnava. Não se intimide, caso no início possa parecer complicado. Ninguém espera que um novato saiba de tudo isso imediatamente. Observe os devotos maduros, releia estas instruções e assim poderá aperfeiçoar sua prática de etiqueta Vaishnava aos poucos. Na dúvida, consulte um devoto mais experiente com quem tenha afinidade.

Sri Chaitanya Mahaprabhu enfatiza:

“Deve-se cantar o santo nome do Senhor em um estado de espírito humilde, considerando-se inferior à palha na rua; deve-se ser mais tolerante que uma árvore, destituído de todo o sentido de falso prestígio, e deve-se estar pronto para oferecer todo o respeito aos outros. Em tal estado de espírito, pode-se cantar o santo nome do Senhor constantemente.” – Sri Siksastaka 3

Acima de tudo devemos entender que a cultura Vaishnava é uma cultura de tolerância, respeito e humildade.

Para finalizar, é sempre bom lembrar a instrução várias vezes citada por Srila Prabhupada, tirada do Padma Purana, que a principal ordem é “sempre se lembrar de Krishna” e a principal proibição é “nunca se esquecer de Krishna”.