por Giridhari Das
Para muitas pessoas, a adoração da Deidade é um dos elementos mais difíceis de compreender (ou aceitar) das práticas de bhakti-yoga. Causa profunda estranheza para certas pessoas a noção de Deus como uma estátua ou quadro, aparentemente tão limitado, imóvel…tão material!
Tem um verso muito importante no Srimad Bhagavatam, que diz: “Transcendentalistas eruditos que conhecem a Verdade Absoluta, chamam essa substância não dual de Brahman, Paramatma e Bhagavan” (SB 1.2.11).
Brahman é a luz, ou efulgência, de Deus que tudo penetra, que permeia toda realidade. Os impersonalistas tem como meta se fundir nessa luz divina, perdendo sua identidade e individualidade. Livrando-se da contaminação material, esse tipo de transcendentalista experimenta uma profunda paz e alívio.
Paramatma, que literalmente significa Superalma, é a forma localizada do Senhor que sustenta a realidade material. Deus está no coração de todos nessa forma de Paramatma. Não só no coração de todo corpo material, mas também em todos os átomos da criação. Os grandes místicos entravam em meditação profunda na Superalma, adquirindo assim todo tipo de poder místico e controle sob seus corpos e a energia material de Deus, em sua comunhão com o divino.
Bhagavan, porém, é a forma pessoal de Deus, do Senhor Transcendental. Deus tem ilimitadas formas espirituais (não materiais) para se relacionar pessoalmente de ilimitadas maneiras com Seus ilimitados devotos. Essa é a plataforma suprema de amor, onde existe um campo ilimitado para o ser vivo expressar seus sentimentos amorosos em relação ao Senhor. De todos os prazeres, nenhum se compara ao prazer do relacionamento amoroso, seja como amigo, parente (filho, pai, mãe, etc.) ou amante. E a qualidade do relacionamento é diretamente ligada às qualificações de quem está amando e de quem está sendo amado. Assim, pode-se entender que não há situação mais elevada, mais prazerosa e feliz, do que eternamente ser supremamente qualificado e amar alguém supremamente qualificado. Essa é a posição da plataforma transcendental da Verdade Absoluta em Bhagavan. Como somos, por constituição, partes e parcelas do Senhor com Suas mesmas qualidades, já somos, sempre fomos e sempre seremos, supremamente qualificados. Basta nos livrar de nossas errôneas e ilusórias concepções sob nosso eu, ou seja, limpar o coração de tudo aquilo que nós não somos. E a Suprema Personalidade de Deus, que tem ilimitados nomes devidos a Suas ilimitadas formas transcendentais, é por definição o reservatório infinito de todas as boas qualidades. Portanto, nosso estado original é de estar assim situado numa rica, variada e eterna relação pessoal de amor puro com o Senhor.
Vale a pena notar que a plataforma Paramatma, inclui e supera as realizações e benefícios da plataforma Brahman e que a plataforma Bhagavan, inclui e supera as realizações e benefícios das plataformas Brahman e Paramatma. Tudo se cumpre e atinge automaticamente ao entrar no estágio de perfeita comunhão amorosa pessoal com Deus.
Uma dessas formas ilimitadas que o Senhor aceita é a Deidade, tecnicamente chamada de arca-vigraha. Em nosso estado condicionado perdemos nossa capacidade natural de ver, tocar, cheirar, sentir, etc. aquilo que é transcendental. Conseguimos apenas ter essas experiências com a energia inferior de Deus, Sua energia material. Por isso, sendo todo misericordioso, Deus aceita uma forma composta de Sua energia material (na forma de pedra, metal, tinta, etc.) para que mesmo em tal condição podemos nos relacionar com Ele diretamente em Sua forma Bhagavan. A Deidade assim deixa de ser matéria, deixa de ser uma estátua ou pintura, e passa a ser uma forma transcendental do Senhor, apesar de manter as características de uma criação material. Sem Sua forma arca-vigraha, e sem já estar na plataforma transcendental liberada, limitamos muito nossa oportunidade de nos relacionar com Deus na plataforma Bhagavan, Seu supremo aspecto. A adoração da Deidade, portanto, é a oportunidade de se situar na plataforma transcendental de serviço amoroso ao Senhor, de realizar importantes aspectos inerentes ao relacionamento amoroso entre duas pessoas, como alimentar, tocar, presentear, cuidar, etc.
Praticar vida espiritual significa justamente isso – praticar vida espiritual! Significa fazer aqui e agora aquilo se faz no estado espiritual puro almejado. Aquele que ignora sua individualidade e a existência individual de Deus e almeja a plataforma Brahman, onde nada se faz, nada se pensa, nada se deseja e apenas “é”, pratica então nada fazer, nada pensar, nada desejar e apenas “ser”, e assim avança espiritualmente. Aquele que compreende sua individualidade eterna e a existência de Deus em tudo e todos, querendo assim entrar em total comunhão com o aspecto divino da realidade a sua volta, faz exatamente isso ao fixar sua consciência na Superalma, e assim avança espiritualmente. E aquele que compreendeu sua individualidade eterna e o aspecto pessoal de Deus, querendo assim apenas viver um relacionamento amoroso infinito e eterno com o Senhor Transcendental, faz exatamente isso ao relacionar-se com Ele pessoalmente, chamando-O, alimentando-O, tocando-O, presenteando-O, cuidando dEle, etc., e assim avança espiritualmente.
Portanto a adoração da Deidade é uma prática natural e importante no processo de nos re-estabelecermos em nosso eterno e amoroso relacionamento pessoal com Deus, bhakti-yoga, e, exatamente por isso, causará estranheza para aqueles que são materialistas e/ou estão buscando outras metas transcendentais.